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A AUDITORIA COMO FERRAMENTA DE MELHORIAS ORGANIZACIONAIS

A AUDITORIA COMO FERRAMENTA DE MELHORIAS ORGANIZACIONAIS

16 de Maio de 2022

Hercule Poirot e Sherlock Holmes, personagens de Agatha Christie e Arthur Conan Doyle, respectivamente, são dois dos mais conhecidos detetives da literatura e do cinema. Utilizando suas mentes privilegiadas, eles descobrem pistas que ninguém mais foi capaz de ver e, com base na lógica e na dedução fora do comum, encontram os culpados para os mais diversos crimes que a imaginação de seus autores possam criar.

No imaginário dos mais apaixonados, o trabalho de um auditor pode se parecer um pouco com essas aventuras escritas nos livros de ficção: uma pessoa vai desbravar uma organização em busca de provas que ninguém mais conseguiu encontrar e surpreender a todos com suas habilidades investigativas. Para outros, talvez, um auditor se pareça mais com um carrasco, pronto para encontrar defeitos em tudo que a equipe da empresa se empenhou tanto para fazer. No entanto, no fim das contas, nem uma coisa nem outra são verdadeiras.

Uma auditoria realmente consiste em perseguir uma pista para encontrar provas; nós chamamos essas pistas de trilhas de auditoria e as provas, de evidências. Porém, ao contrário da investigação de Sherlock, nenhum crime foi cometido e o auditor não está buscando um culpado para levar para a cadeia. Além do mais, a arte da dedução aqui só é bem-vinda se estiver acompanhada de evidências concretas, ou seja, sem subjetividade por aqui!

E também é verdade que essas evidências podem, às vezes, demonstrar algumas não conformidades, mas isso também não torna o nosso herói (ok, talvez eu tenha exagerado no “herói”) alguém que está “do lado negro da força”.

Na real, a auditoria é, segundo a ISO 19011:2018, que é uma norma que dá diretrizes sobre auditorias (aliás, auditores adoram normas, fique sabendo) um “processo sistemático, independente e documentado para obter evidência objetiva e avaliá-la objetivamente, para determinar a extensão na qual os critérios de auditoria são atendidos”. Parece meio complicado, mas não é! Calma que eu vou te explicar.

Vamos começar com o fato de uma auditoria ser um processo sistemático.

A gente pode pensar em sistemática como alguma coisa que segue uma metodologia, que é constante, e isso se encaixa perfeitamente em como uma auditoria funciona. Ela tem começo, meio e fim, e é planejada nos mínimos detalhes, inclusive os horários que cada processo tem que ser auditado e os momentos de reuniões e preparação de relatórios.

Isso é bom, porque a auditoria não é uma inspeção, uma vistoria ou qualquer outra coisa do gênero. Ela tem que ser de conhecimento de todos e todo mundo deve saber sobre suas regras e premissas. Essas regras, inclusive, são explicadas na reunião de abertura, que deve acontecer em toda e qualquer auditoria antes da visita aos processos. Quer coisa mais sistemática do que isso?

Outra coisa que a definição da ISO 19011 diz é que a auditoria é um processo documentado, e isso também é uma grande verdade. O planejamento, por exemplo, é documentado e enviado com antecedência, e o relatório da auditoria – que também é formalizado – apresenta todas as informações sobre o evento: quem foram os auditados, quais evidências foram observadas, os pontos fortes, as conformidades e, se for o caso, as não conformidades também.

Já a independência, outra característica da auditoria, é um assunto muito sério e importante para nós. Um organismo de certificação, como o Bureau Veritas, é auditado frequentemente por entidades nacionais e internacionais com relação a uma série de requisitos que estão descritos numa norma específica para certificadores, a ISO 17021 (não falei que a gente adora uma norma?), sendo que um dos itens-chave dessa norma é exatamente a questão da independência. Um auditor do Bureau Veritas tem que declarar, periodicamente, todas as empresas com que ele tem algum tipo de relação, como consultorias prestadas, treinamentos internos realizados ou mesmo se há algum parente ou amigo que trabalha lá, de modo que ele não seja escalado para auditar nenhuma dessas empresas. E isso é confirmado a cada auditoria agendada a fim de que não haja nenhum conflito de interesses e a auditoria possa ser sempre imparcial.

Agora, vejamos o que quer dizer o resto da definição quando afirma que a auditoria é um processo “para obter evidência objetiva e avaliá-la objetivamente, para determinar a extensão na qual os critérios de auditoria são atendidos”. Com base nas trilhas de auditoria, o auditor vai observando as atividades, entrevistando as pessoas e analisando os documentos da organização para buscar evidências de que os processos foram planejados, buscar evidências de que as atividades estão sendo realizadas como foram planejadas, evidências de que o desempenho desses processos está sendo monitorado, evidências de que ações estão sendo tomadas para corrigir o que não está funcionando, evidências de ações para melhorar os resultados da empresa, evidências, evidências, evidências... Ah, e se você notou qualquer semelhança dessa abordagem com o PDCA (Planejar – Executar – Checar – Tomar Ação), saiba que isso não é mera coincidência.

Então, quando os auditores comparam as evidências coletadas com as normas – que são os tais critérios de auditoria –, eles chegam à conclusão de que aquela evidência, comparada com o requisito da norma correspondente, é conforme, se ela atender ao requisito, ou não conforme, se não atender. Simples assim.

E, por mais que você possa estar pensando que as não conformidades são os pontos principais da auditoria, na realidade, elas são a exceção... Pode parecer óbvio o que eu vou dizer a seguir, mas, se o auditor passou alguns dias auditando uma empresa e registrou uma não conformidade, todo o resto das evidências encontradas é de conformidade, não é? Via de regra, as conformidades aparecem em muito maior número que as não conformidades, que são conhecidas como NCs.

No entanto, se uma NC aparecer (ou até mais de uma, quem sabe?!), nós temos que agir, e esse é ponto mais importante de todos, porque as auditorias são feitas para que o sistema de gestão possa melhorar, e quando não conformidades são encontradas, temos aí uma oportunidade de consertar o que não está funcionando e fazer com que os resultados daquele sistema sejam cada vez mais satisfatórios. Essa é a hora de estabelecer planos de ações corretivas para eliminar as causas e evitar que essas não conformidades se repitam, essa é a hora de fazer com que o sistema seja melhor do que ele era antes da visita do auditor!

Coloque isso na cabeça de todo mundo da sua empresa e nunca mais as pessoas terão medo de auditorias, pois, se todos tiverem essa mentalidade, acabarão utilizando as auditorias para darem um passo adiante em seu sistema e torná-lo cada vez mais maduro.

Não conformidades são situações que fazem parte de um sistema de gestão e podem surgir, até mesmo, em sistemas maduros e bem consolidados. Não é porque a auditoria não encontrou nenhum desvio que ele não exista; ao mesmo tempo, se as auditorias identificam muitas NCs, isso não quer dizer que todo o trabalho que foi feito está perdido, afinal, sempre é tempo de melhorar, isso vale até para a nossa vida particular, não é mesmo?

Sendo assim, aproveite o momento das auditorias, acompanhe o trabalho dos auditores, tire suas dúvidas a respeito de todos os apontamentos que forem feitos, determine ações corretivas que realmente ataquem as causas das não conformidades e faça valer o evento de auditoria para que você colha bons frutos dela.

Uma visão externa e independente, que não está acostumada com o dia a dia da empresa nem presa aos “vícios” dos processos, pode trazer novos pontos de vista, ampliar a visão da organização e trazer à tona algumas questões que você, por estar todos os dias vivenciando aquela rotina, já não consegue mais enxergar, a não ser que tenha o senso de percepção de Hercule Poirot e a capacidade de dedução de Sherlock Holmes... Elementar, meus caros.

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Bureau Veritas

Heitor GrimaEngenheiro de Produção, auditor de sistemas de gestão e professor do curso de pós-graduação em SGI do Bureau Veritas